terça-feira, 19 de maio de 2020

Apontamentos para fim de temporada

De mãos dadas eramos nós,
desatados num detalhe em que 
o vento, sorrateiramente, 
desfez.
As flores felizes tornaram-se
distantes, impassíveis.
Nossas estradas não coloriram 
mais em sintonia.
Aquela música que nos dançavam
pelos sentidos entre mares
apenas se apagou.
Anoiteceu uma lágrima desvendando
o fim de laços.
Ponto derradeiro que nos encerra
por cada sentimento.
Os destinos despedem-se 
numa separação incrédula.
Imaginam outras felicidades
perambulando pelas praças.
Dentro da estrela fria de outono,
apresenta-se enfim
o semblante mais discreto
de um inquieto recomeço.
                                                                                                                                            (maio 2020)





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segunda-feira, 11 de maio de 2020

Ariclenes


a Lima Duarte
Meu caro,
eu te entendo.
Os sonhos corrompidos
são apenas artefatos de uma
pátria perdida.
Homens são bordados em
ruas obtusas.
Inquiete aquele ódio escondido
entre gargantas inúteis.
Precisamos renascer diariamente.
O tempo parece brincar
com nossos desejos.
Somos apenas instante.
Dessa forma,
sendo esse instante,
resistiremos.
Tornaremos imunes a
qualquer semblante
de intolerância.
Caminharemos,
em mãos dadas,
a partir de gestos que nos farão
esperança.
Por isso, meu caro,
eu te entendo.
Não deixemos que aquele
passado plúmbeo,
cheirando a versos podres,
ressurja através de mãos
banhadas à sangue.
Traremos vida em nossa arte,
como voz e catavento,
emergida numa bacia
enternecida de
horizontes.

(maio 2020)







sexta-feira, 24 de abril de 2020

Isolamento


Com voz e olhos presos em cárcere,
o mundo para
o mundo morre
o mundo ruína.
Não quero ser herdeiro da maldição
tenebrosa dos homens.
A tempestade invisível é cega.
Irriga o mais boçal dos sentimentos.
Afinal, a visita tão esperada em cada lar
é o desespero.
Todos trancafiados em telas esquálidas,
remoendo aquela esperança que,
definitivamente
teima em não emergir das pedras.
O céu ainda parece escasso de boas novas.
Porém, há um coração nervoso observando
o cárcere,
ávido por flores recém-nascidas exalando
uma maresia confortável.
Existe alguma faísca de tempos futuros
luzindo entre as janelas.
Apesar dos homens.

(abril 2020)

Poema chulo


De minha razão
faço vontade.
Reviro a façanha de
ser mentira.
Um azedo sol
torna-se noite.
O arredor da vida
traduz demônios.
Há vícios que estão presos
na garganta,
esperando ser contidos por um
refúgio de más intenções.
Entre redomas de areia,
delírios transformam-se
em partículas de ausência.
Não existe nada ao redor,
a não ser aquela aflição narcisista
de colher desejos,
de sorrir alguma trova
incompreensível.

Rompemos o gozo do mundo
Agora nos resta a liberdade.


(abril 2020)

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Esboço de felicidade mal curada


Duas taças de vinho na mão.
Alguns absurdos na memória.
Música qualquer nos ouvidos.
A dança gira em algum lugar do estômago.
Festeja-se sabe lá o quê.
Simplesmente há uma fagulha no asfalto, imperceptível.
O gosto de liberdade é forte,
deixa tonto.
Apenas troca beijos com um vento inegociável.
A vida para entre três palavras mal trocadas.
O delírio de esperança é híbrido.
Quer voltar para casa.
Mas os destinos involuntários não permitem.
Uma selva de sensações se dilui nos vinhos,
entre cervejas,
nos bares de esquina,
pelos contentamentos de rostos indecifráveis.
Apenas a felicidade não se completa.
De maneira alguma.
Está à espera de um convite malicioso
para um possível drinque
em qualquer esquina ansiosa
por aí.



(abril 2020)

O último baile das borboletas

Entrelaçadas num baile insano,
borboletas ensaiam uma valsa inundada
de lembranças.
Remendam o ar desprovido de sonhos
através do ranger de seus mistérios.
Não há flor,
nem esperanças,
nem ilusões.
Apenas um zumbido seco que invade
lares, narinas,
escombros.
Resta apenas um momento ofegante,
em que asas absurdas não se harmonizam
com o vigor do tempo.
Sobrou apenas a dança.
Eternizada pela despedida infame
de delírios fingidos
que se desfizeram por 

um longo instante.

(abril 2020)

Soneto suicida


Um disperso deserto pousa em mim
Quieto, como estranha manhã velada.
Da certeza em alvorecer o nada
Ao cantar estranho vício do fim.

Desfaço-me pedaços,vil madeira
Reverso instante que me completa
A raiva contida em cor sorrateira
Reduz o meu chão, verdade repleta.

Espera-se a treva num céu incerto
Amargo regresso desse mar torto
Que me vislumbra espelho de tão perto.

Define o tempo como verso morto
Rasga em retalhos tristes alma fria
Faz da solidão vestígio em agonia.




(abril 2020)

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